ENFRENTAR O PODER E CONSTRUIR A ALTERNATIVA POPULAR
O Projeto de Lei nº 4675 de 2025 [1] é uma importante proposta legislativa porque cria parâmetros por meio dos quais as autoridades competentes podem incidir para mitigar a assimetria de poder que as grandes empresas de plataformas digitais exercem sobre o mercado digital no país. O referido projeto dispõe dos critérios e do processo pelo qual o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) pode designar determinados agentes econômicos como sendo agentes de relevância sistêmica.
O processo de designar um agente de relevância sistêmica é fundamental para que recaia sobre esses agentes obrigações de conduta e de transparência, conforme previsto na proposta legislativa. Pela escala que serviços e produtos de poucas grandes empresas de plataformas digitais possuem atualmente sobre diferentes mercados, esses agentes exercem de forma opaca práticas anticompetitivas para favorecer seus próprios produtos e prejudicar produtos de outros fornecedores. Os processos movidos pela União Europeia contra a Google e a Apple, pelo domínio de seus sistemas operacionais e pelas lojas de aplicativas exemplifica essas condutas nocivas [2]. Outros casos, como a predominância hegemônica de buscadores como o Google exigem que as autoridades e a sociedade brasileira tenha meios de escrutinar as decisões que possam prejudicar o acesso ao mercado e desenvolvimento de outros provedores de serviços e produtos, como bem exemplifica as consequências da adoção do sistema generativo em seu buscador prejudicando o fluxo de trafego sobre outros sites [3].
A campanha Internet Legal compreende que os processos e critérios previstos no Projeto de Lei 4675/2025 podem ser benéficos ao Fediverso brasileiro [4], na medida em que pode aprimorar as condições de acesso à sociedade aos produtos e serviços de redes digitais alternativos aos dos grandes conglomerados do Vale do Silício. Além disso, pode contribuir para o debate de regulamentação do “ECA Digital”, a Lei nº 15.211, de 17 de setembro de 2025 [5], que institui um conjunto de obrigações importantes e necessárias em termos de aferição etária e de moderação de contas e conteúdos, mas que podem ser tratadas de forma proporcional considerando as pequenas comunidades responsáveis pelo desenvolvimento e manutenção das redes federadas.
Contudo, embora reconheçamos os avanços fundamentais que o Projeto de Lei 4675/2025 carrega para a agenda de regulação de plataformas digitais no Brasil e, consequentemente, ao enfrentamento do poder das gigantes do setor, é importante destacar que o projeto não prevê instrumentos que permitam tratar a raiz do problema, da razão de poucas empresas deterem tamanho poder sobre o mercado digital brasileiro. Entendemos que o debate precisa avançar para ir além de uma perspectiva de defesa da concorrência, através do estabelecimento das obrigações de condutas e de transparência; deve avançar em instrumentos que possibilitem desconcentrar o poder de mercado, considerando alternativas de desmembramento dos grandes grupos econômicos. Aqueles serviços, ou produtos, que atualmente desempenham um papel estratégico de condicionar o acesso das pessoas a outros provedores de serviços e produtos, deveriam ser tratadas a partir de uma perspectiva de interesse público: da defesa da concorrência, do desenvolvimento e do bem-estar da sociedade.
Ao mesmo tempo, para além do escopo de uma proposta legislativa, é urgente e fundamental que se desenvolva políticas de investimento e desenvolvimento de tecnologias consideradas estratégicos para o provimento de serviços e bens públicos na área da saúde, educação, segurança e cultura. As redes digitais como Meta, TikTok, YouTube e Twitter (ou X) são a face mais evidente da concentração de poder que as empresas de plataformas digitais possuem sobre a sociedade e a economia brasileira, mas há, ainda, outro mercado tão dependente quanto de poucas grandes empresas como o mercado de centros de dados e dos serviços de “nuvem”[6].
NOTAS DE FIM DE PÁGINA
- Projeto de Lei nº 4.675 de 2025. Câmara dos Deputados. 18 de setembro de 2025. https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=3003060&filename=PL%204675/2025
- Deutchewell. 2025. Corte da UE condena Apple e Google em ações bilionárias. 10 de setembro. https://www.dw.com/pt-br/corte-da-ue-condena-apple-e-google-em-a%C3%A7%C3%B5es-bilion%C3%A1rias/a-70182354
- Mello, Patrícia Campos. 2025. Versão IA da busca do Google derruba tráfego para sites de veículos de notícias em 20,6%, diz estudo. 28 de novembro. Folha de São Paulo. https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2025/11/versao-ia-da-busca-do-google-derruba-trafego-para-sites-de-veiculos-de-noticias-em-206-diz-estudo.shtml
- Saiba mais em 1º WebSocialBR:https://websocial.org.br/
- Lei 15.211 de 2025, 17 de setembro. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2025/Lei/L15211.htm
- Convergência Digital. 2024. Nuvem cresce 16% em 2023, com AWS, Microsoft, Google, Alibaba e Huawei no topo. 23 de julho. https://convergenciadigital.com.br/mercado/nuvem-cresce-16-em-2023-com-aws-microsoft-google-alibaba-e-huawei-no-topo/